Entrevista com Silvana Goellner - Evolução do Futebol Feminino

28 MAR 2018 18:14

TRABALHOS ACADÊMICOS DÃO VISIBILIDADE À SILVANA GOELLNER NA EVOLUÇÃO DO FUTEBOL FEMININO NO BRASIL

A função da universidade é demonstrar a importância de temas ligados a gênero, sexualidade, racismo, preconceito de gerações e respeito à diversidade, entre tantos outros. E a professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, Silvana Vilodre Goellner, 55 anos, formada em Educação Física pela Universidade Federal de Santa Maria, mestre pela UFRGS e doutora em Educação pela Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP, vivencia essa experiência há mais de 20 anos em sala de aula. Sempre estudiosa do binômio mulheres e esportes, ela tem se debruçado nos últimos tempos sobre o futebol feminino, especialmente depois de uma conversa que teve com a ex-capitã da seleção brasileira, Aline Pellegrino. A exigência de CBF, Fifa e Conmebol para que os clubes que disputem a Copa Libertadores a partir de 2019 tenham equipes femininas é, segundo Silvana, necessária para garantir que as mulheres exerçam o seu trabalho. Ela compara a medida com a política de cotas nas universidades, fundamental, porque outras tentativas foram infrutíferas. Nesse momento, assegura a docente, isso é importante para o processo.

 

FUTEBOL FEMININO

Através da pesquisa, Silvana mostra a importância da mulher no esporte. E quando busca-se no Google informações sobre a história do futebol feminino, logo surge o nome da professora que, pelo muito que escreve sobre o tema, é uma espécie de ouvidora quando são discutidas mudanças para a modalidade em nível de país. Silvana é chamada pela CBF por sua visibilidade acadêmica, é uma das curadoras do Museu do Futebol, participa do Comitê de Reforma do Futebol Feminino da CBF. 

A história da mulher, diz a professora, sempre foi produzida por ela mesma e, através do esporte, vem o empoderamento. Em contrapartida, ela defende que o futebol dos homens não é parâmetro para nada no Brasil, “nem vôlei, nem basquete. Não dá para comparar. É atípico, o Brasil é o país do futebol. É um espaço privilegiado para os homens devido às premiações, aos patrocínios; é uma mercadoria, é um espetáculo rentável”. Por outro lado, a modalidade feminina não tem estrutura, nem visibilidade, nem patrocínio. Enquanto os jogadores de futebol masculino vendem lâminas de barbear, cuecas, desodorantes, vitaminas, a publicidade não abre espaço para as atletas, enfatiza Silvana. “As mulheres não são garotas-propaganda, nem mesmo a Marta, cinco vezes eleita a melhor jogadora do mundo”.

A importância de Marta, Formiga e Cristiane é enorme. Silvana diz que elas são exemplos para muitas meninas que jogam ou querem jogar futebol. Hoje, conta a professora, “há mais de 100 equipes femininas no Brasil, essas mulheres têm papel importante. A Marta é incomparável”.

 

A HORA E A VEZ DAS MENINAS

Quando se fala em futebol feminino, Silvana diz que é preciso lembrar que ele esteve proibido durante 40 anos no Brasil com o argumento de que não era compatível com a natureza feminina, podendo masculinizar as mulheres. E isso, defende a professora, tinha a ver com ocupação de espaços e não com biologia ou saúde, “senão as mulheres seriam proibidas de trabalhar na roça”, diz. A regulamentação da modalidade veio apenas em 1983 e futebol era, então, um espaço de lazer. E são justamente as crianças da década de 80, assegura a professora, que são os pais das meninas que hoje estão nas escolinhas de futebol, querendo fazer deste esporte sua profissão. Mas tudo é muito novo ainda, complementa Silvana, ao lembrar que a primeira Copa do Mundo ocorreu em 1991, enquanto a participação do futebol feminino nos Jogos Olímpicos iniciou em 1996. “Um dos limitadores é a falta de profissionalismo, o futebol é uma ocupação, não profissão”, conclui.

Então, a grande pergunta é: quem romperia isso? A professora responde de pronto: Vários segmentos. Empresas, público, universidade, mídia, CBF. Uma nova cultura com um novo olhar para as mulheres e o futebol. Aqui entra também a mídia, cujo papel é analisar as atletas pelas suas técnicas e táticas. Enquanto os meios de comunicação tradicionais são tímidos na divulgação dos campeonatos femininos, as transmissões de CBF, governo, radiowebs e sites têm assegurado que as informações cheguem ao público. 

Saindo de dentro do gramado em chegando na linha lateral, Silvana recorda o episódio que destruiu a carreira da assistente de arbitragem Ana Paula de Oliveira, hoje na CBF. “O corpo pertence à mulher, mas a sociedade o vê como de domínio público. As escolhas das mulheres são públicas. É preciso esclarecer que as mulheres buscam condições iguais, não acabar com os homens”, defende a professora.

 

TRAJETÓRIA

Mas, e a Silvana? Como ela envolveu-se com o esporte? Como inúmeras meninas de sua geração, ela jogava bola com os irmãos e os primos e teve uma criação que propiciava a prática de esportes, nadava em rio e subia em árvores na infância em Carazinho. E conta que, quando era mais jovem, praticava natação e vôlei. Atualmente, com problemas no joelho, é adepta de Pilates e caminhada. Sua vocação para o esporte a fez ingressar na Faculdade de Educação Física com o intuito de trabalhar na área, de forma geral. Mas ela logo interessou-se pela história do esporte, especialmente naquela ocorrida durante a ditadura militar. E assim, acabou lecionando Educação Física para ensino médio, fundamental e associações comunitárias.

Silvana trabalhou na Prefeitura de Porto Alegre no governo Olívio Dutra e, em 1989/1990 esteve à frente da Fundação de Educação Social e Comunitária – FESC, coordenando o programa de Educação Física nos centros comunitários, com esporte e lazer. Em 1993, ingressou na UFRGS, para lecionar História da Educação Física, hoje Estudo Socioculturais. Ela coordena um programa de extensão chamado Futebol e Mulheres. E fala de dois projetos muito importantes para contar a história das mulheres que fazem o futebol no Brasil: a exposição Mulheres e Futebol, que hoje encontra-se na Escola de Educação Física,  Fisioterapia e Dança – Esefid, ficou durante um ano no Museu da UFRGS e; o Museu do Inter apresenta desde maio do ano passado até o final de abril deste ano exposição que conta a história do futebol feminino do clube. Silvana está à frente desses dois resgates.

 

Izabel Rachelle 

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