A ex-jogadora de futebol Isabel Cristina Nunes, a Bel, bateu um bolão nas décadas de 80 e 90 e vê com bons olhos o atual momento do futebol feminino, com a realização do campeonato brasileiro em duas séries e das competições estaduais, além da visibilidade da Seleção Brasileira hoje em relação a de outras gerações. Ressalta que, quando jogava, muitas vezes acreditou que a modalidade iria engrenar e a coisa não aconteceu. Gaúcha, Bel vive hoje em Florianópolis, é professora de Educação Física na rede estadual e enfrentou, há cerca de três anos, a descoberta e o tratamento de um câncer de mama.
A paixão pelo futebol conta, começou quando tinha seis, sete anos e acompanhava o pai que jogava na várzea ao lado de Miquimba, tio de Ronaldinho Gaúcho. Do lado do campo, as crianças faziam o seu campinho. Bel recorda que gostava tanto das brincadeiras ditas de menino – futebol, bolita e patinete, como as de menina - casinha, comidinha e boneca. Na época em que as brincadeiras aconteciam na calçada – Bel morava no bairro Cavalhada, em Porto Alegre, ela jogava futebol com os meninos na rua. Mais tarde, com 11 anos, ela, a irmã e algumas amigas montaram um time para enfrentar a equipe feminina do Nonoai Tênis Clube, no bairro vizinho. Elas perderam o jogo, mas o treinador do Nonoai, Getúlio Aurélio Fredo, hoje no futebol da Estônia, a convidou para integrar a equipe.
As meninas tinham idades que variavam dos 11 aos 14 anos, recorda Bel, jogavam e ganhavam muitos jogos, “jogávamos às segundas-feiras e o ginásio do Clube enchia, eu aguardava a próxima segunda com ansiedade, sempre fui goleadora”. Outra lembrança da infância remete aos torneios disputados o dia inteiro e, na volta para casa, com hematomas e as pernas machucadas, era questionada pela mãe do porquê daquela escolha, “mas não adiantava, eu amava, futebol é a minha paixão”. E foi assim, ao natural, que quando o Sport Club Internacional abriu o Departamento do futebol Feminino e Bel tinha 14, 15 anos, que a equipe do Nonoai, então Pepsi Bola, foi fazer parte da base do Inter.
HISTÓRIA
A trajetória de Bel no futebol mistura-se com a história do futebol feminino do Internacional. “Fiquei no Inter bastante tempo, em alguns anos o clube apoiava bastante o futebol feminino, noutros não, aí a gente ia para o futebol de salão, sou pentacampeã estadual; reabria o departamento, a gente voltava, era muito ruim, a gente não vivia do futebol, a diretoria corria atrás de patrocínio para nos dar ajuda de custo, sou tricampeã gaúcha pelo Internacional, tenho um vice-campeonato brasileiro pelo Inter também”. Além do Internacional, quando fez dupla de ataque com Duda, hoje gerente de futebol feminino do clube, Bel jogou no Chimarrão de Estância Velha, onde foi pentacampeã estadual de futsal, Torino da Itália e Grêmio Football Porto-Alegrense. Pela Seleção Brasileira, foi bicampeã sul-americana e, na lista das atletas que iriam para as Olimpíadas de Atlanta, foi cortada devido à inflamação no púbis.
Ela lembra que, nos 80,90, as equipes femininas jogavam as preliminares dos jogos dos profissionais, “isso dava uma visibilidade, a gente jogava bastante, tinha torcedores que iam mais cedo para assistir ao futebol feminino, era emocionante”. Ela lembra que quando o Inter enfrentava o Radar – tradicional equipe do Rio de Janeiro, “a gente perdia por três ou quatro gols, porque as meninas do Radar treinavam todos os dias, nos dois turnos, enquanto nós treinávamos três vezes por semana, num turno só”. Bel avalia que qualidade técnica – o Radar era a base da Seleção Brasileira, preparo físico e a estrutura faziam a diferença e, por isso, acredita que “a modalidade agora veio para ficar em função do treinamento de base, com escolinhas para meninas, campeonatos. Vejo evolução, mas precisa mais apoio”, complementa.
OUTRO JOGO
Fora dos gramados desde os 35 anos, quando a vontade de ser mãe falou mais alto e Bel não imaginava que daria para conciliar as duas coisas, ela recebeu um convite do Avaí Futebol Clube para coordenar o futebol feminino, mas disse que, como não havia contrapartida, não aceitou. Foi a descoberta de um caroço no seio em junho de 2015, através do autoexame, que acendeu a luz vermelha para Bel. Oito meses antes, um médico no posto de saúde a aconselhou a não fazer mamografias com regularidade porque a radiação era prejudicial, que o espaço entre um exame e outro poderia ser de quatro, cinco anos. Depois do autoexame, fez mamografia, cirurgia, radioterapia e quimioterapia. “O tumor poderia ser do tamanho de um grãozinho de arroz e não de 1,5cm. Faça o exame, a gente acha que nunca vai acontecer, é um tratamento muito agressivo, destrói células cancerígenas, mas as boas também, agora estou bem, estou treinando, dou aulas de Educação Física”, desabafa. Sobre o futebol? “Quero juntar algumas mulheres para jogar uma vez por semana, para a gente se divertir, se distrair”.
Izabel Rachelle
Foto: Acervo Pessoal Bel
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